6 de jun. de 2012

Psychotic Eyes – Metal Cabeça para todos os gostos (entrevista)




Por Marcos Garcia


A banda Psychotic Eyes já está na estrada desde 1999, e somente agora, depois de seu segundo CD, I Only Smile Behind the Mask, o trio tem ganho mais exposição na mídia e mais reconhecimento dos fãs da cena Death Metal, justamente porque o trio aposta em composições com estruturas harmônicas não convencionais, bem como letras bem feitas que levam o fã a reflexão.




Aproveitando o bom momento, fomos bater um papo com Dimitri Brandi, vocalista/guitarrista da banda, e saber um pouco mais do passado, presente e futuro da banda.

Metal Samsara – Primeiramente, gostaríamos que pudesse contar aos fãs um pouco da história da banda, já que uma boa parcela dos fãs ainda não conhece a batalha de vocês.

Dimitri Brandi - É verdade, somos “total underground”, ninguém nos conhece (risos)! Isso mostra a dificuldade de divulgação do Metal no Brasil, pois estamos na cena há mais de dez anos! Formamos a banda em 1999. Vi um anúncio no site da Rock Brigade, uma banda com influências de Death, Kreator e Slayer procurava guitarrista e vocalista. Eu tocava guitarra e estava iniciando nos vocais e adorava as três bandas. Respondendo ao anúncio conheci o Alexandre (Tamarossi, baterista) e estamos juntos até hoje. Vários outros músicos já passaram pela banda, outros guitarristas e baixistas. Hoje estamos com a melhor formação da história do Psychotic Eyes, em formato power-trio, com o Douglas Gatuso tocando baixo. Não me canso de elogiar e de me impressionar com a performance dele ao vivo, tocando as linhas do disco novo. Nesse tempo lançamos duas demos e dois álbuns. O primeiro, auto intitulado, saiu em CD independente em 2007. O segundo é o I Only Smile Behind the Mask, por enquanto só disponível para download, lançado em 2011.

Metal Samsara – Falando do passado, você pode ver que houve alguma evolução na musicalidade da banda desde o início, passando pelo primeiro CD (Psychotic Eyes) até chegar no I Only Smile Behind the Mask? Poderíamos assumir que as mudanças de formação chegaram a ser um motivo dessa evolução? E quais seriam as diferenças mais marcantes entre os dois trabalhos?

Dimitri - As mudanças de formação foram importantes, mas não foram determinantes dessa mudança de sonoridade. O principal é que eu e o Alexandre crescemos muito como músicos nestes anos todos. Nunca paramos de estudar música nem deixamos de buscar novas sonoridades e influências. Não somos como a maioria dos músicos, que uma certa hora para de buscar novos sons e fica ouvindo sempre as mesmas coisas que o influenciaram. Nós gostamos de descobrir bandas novas, adoro acompanhar os lançamentos e aproveitar novas sonoridades. Com isso acabamos acrescentando muitos elementos diferentes ao som do Psychotic Eyes. A diferença principal entre os dois álbuns é a sonoridade voltada para uma guitarra só, e o acréscimo de, digamos, alguns elementos musicais bem esquisitos para uma banda de Death Metal.

Metal Samsara – A sonoridade da banda foge do convencional do estilo, sendo mais variada e contendo toques de Jazz e mesmo de MPB aqui e ali. Isso é intencional ou vem do background musical de vocês? Ainda há muito preconceito em relação ao uso de estilos musicais de fora dentro dos subestilos de Metal, logo, isso não seria um motivo para muitos fãs torcerem o nariz ao seu trabalho?

Dimitri - Essa mistura de estilos é intencional sim, mas não haveria como fugir disso, pois essas sonoridades estão nas nossas influências. Todos do Psychotic Eyes somos muito fãs de Rock Progressivo, principalmente do Rush e do Yes, que são uma referência constante no nosso trabalho de composição, junto com o Death, Iron Maiden, Rage, Van Halen, Slayer, Kreator, Exodus e outras bandas de Thrash Metal. No último álbum deixamos as influências de Progressivo e Hard Rock aparecerem mais, e fizemos questão de acrescentar elementos de música brasileira. Há preconceito, mas o fã de Metal em geral tem cabeça aberta, pois sabe como é sentir preconceito, já que a sociedade torce o nariz para o Metal. Acho que a resistência maior vem quando uma banda deforma o próprio som só para parecer brasileiro. Isso soa muito falso, e não foi isso que fizemos. Não usamos berimbau nem lata de água. O que fizemos foi estudar elementos da música brasileira, como acordes com dissonâncias e ritmos brasileiros e acrescentar isso no nosso som, sempre num contexto de Metal extremo. O Alexandre pode tocar um fraseado de ritmo brasileiro na caixa enquanto faz um blasting beat ou uma levada rápida com bumbo duplo. Continua sendo Metal extremo mas soa diferente.

Metal SamsaraI Only Smile Behind the Mask teve a mixagem e masterização feitas por Jean François Dagenais (nota: guitarrista do Kataklysm). Como foi trabalhar com ele? O resultado foi satisfatório em termos de produção? Ele chegou a interferir em algo no tocante às músicas?

Dimitri - Foi uma experiência fantástica! Desde a primeira vez que ouvi uma produção dele, do álbum Epic do Kataklysm, eu imaginava como soaria o Psychotic Eyes com aquela sonoridade, pesada e extrema, mas sempre límpida, em que você ouve todos os instrumentos. Quando começamos a preparar o material do I Only Smile Behind the Mask, entrei em contato com ele, que pediu para eu enviar nosso primeiro CD. Ele gostou e se interessou em trabalhar conosco. O curioso é que foi feito tudo à distância. Ele me mandou instruções de como fazer a gravação. Gravamos a bateria no estúdio HBC, em Guarulhos/SP. Gravei as guitarras e vocais na minha casa em Campinas/SP, e o baixo foi registrado pelo Rodrigo Nunes no Drowned Estúdios, do Marcos Amorim da banda Drowned, lá em Belo Horizonte/MG. Depois disso enviei os arquivos pro Dagenais fazer a mixagem e masterização no estúdio dele em Montreal, no Canadá. Foi um disco gravado em três cidades do Brasil e mixado no Canadá, mais internacional impossível (risos)! Ele não interferiu nas músicas nem nos arranjos, mas muitos detalhes da mixagem mudaram nossa forma de pensar as músicas. A sonoridade que ele conseguiu ficou fantástica e nos orgulha muito, eu adoro ouvir o disco e fico até emocionado com o som da minha guitarra depois da timbragem que o Dagenais conseguiu.






Metal Samsara – Fora uma musicalidade não convencional, o CD brinda o ouvinte com conceitos bem diferentes dos chavões vistos no Death Metal, inclusive pelo próprio título. Fale um pouco sobre elas e sobre como elas foram surgindo.

Dimitri - Quando comecei a ouvir Metal, eu não dava a menor bola para as letras. Acho que é normal, em relação aos fãs de Heavy Metal em geral, encarar o vocal como mais um instrumento. Tem também a dificuldade, ou barreira, que é o idioma inglês. A maioria do público não é fluente em língua estrangeira, então ouvir bandas cantando em outros idiomas sempre é uma dificuldade. Sabe quando sua mãe diz "a música é legal, mas eu não entendo nada do que ele fala?". No nosso país, então, a música é muito conectada à letra, pois a MPB sempre foi bem alimentada por bons poetas, como Vinicius de Moraes, Noel Rosa e Chico Buarque. Somos um povo que valoriza as palavras na música. Só muito mais tarde, quando meu estudo de inglês evoluiu, é que fui prestar atenção nas letras das minhas músicas favoritas. E foi uma grata surpresa, encontrar verdadeiras obras de arte da poesia transformadas em letra de Heavy Metal. No Metal existem alguns gênios na arte de escrever letras, como Geoff Tate (Queensryche), David Mustaine (Megadeth), Blaze Bailey e Warrell Dane (Nevermore). Outros letristas que estão entre as minhas influências são Neal Peart (Rush), Jon Anderson (Yes) e o Paul McCartney. Quando sentei para escrever as letras desse disco, eu queria que elas tocassem e sensibilizassem quem as lesse. No primeiro álbum colocamos as letras traduzidas, mas ninguém comentou muito. Elogiavam a iniciativa mas não houve quem comentasse o conteúdo das letras. Acho que é porque não fugimos do padrão, falamos de guerra, filmes, invasões alienígenas, tragédias, crimes, coisas típicas do Death Metal. Então eu sabia que seriam poucos os fãs do Psychotic Eyes que iriam atrás das letras, mas eu queria fazer esse trabalho por mim mesmo. Acho que foi por causa disso que me abri tanto no disco, escrevendo sobre amor, separação, sobre a morte do meu pai, sobre os sentimentos de culpa, etc.

Metal Samsara – O disco foi disponibilizado para download, e nem mesmo chegou a ter cópias físicas, certo? Fora a economia, isso seria uma estratégia não só para alcançar um público maior, bem como para atingir fãs de fora do Brasil? 

Dimitri - O nosso primeiro álbum foi prensado e lançado de maneira independente. Mas não conseguimos atingir um grande público, pois a distribuição é muito difícil. As lojas não compram o seu disco, então temos que vender o CD pelo correio, o que encarece e dificulta, pois o fã não vê o CD na loja. Além disso, a venda de CDs de bandas brasileiras, hoje, é quase inexistente. Infelizmente o fã de Metal no Brasil não compra discos de bandas brasileiras. Por isso, optamos por lançar o disco como download, gratuito ou pago. Além da facilidade de divulgação, pois assim conseguimos divulgar nossa música no mundo inteiro com facilidade, fica a opção para o fã pagar ou não pela música. O lado financeiro nem é tão importante assim, pois somos uma banda independente, nunca tivemos lucro com o Psychotic Eyes, até porque é impossível viver de Metal no Brasil hoje. Estamos muito felizes com a opção, pois I Only Smile Behind the Mask tem sido muito baixado, o que mostra que está atingindo mais gente do que se fosse um CD físico. Isso é o mais importante, eu quero que nossa música se espalhe e seja ouvida pelo maior número de pessoas possível.






Metal Samsara – As críticas na mídia especializada em Metal foram bastante diversas, com alguns críticos baixando o porrete, e outros exaltando a banda. Como vocês encaram isso? 

Dimitri - Natural, não dá para agradar a todos. Mas mesmo os críticos que não gostaram do disco deram notas altas, o que achei curioso, e destacaram elementos positivos. Levo numa boa as críticas negativas, até porque sempre temos muito a aprender com elas. E, convenhamos, Death Metal extremo com elementos de Rock Progressivo, Hard Rock, Jazz e música brasileira não é um som fácil de ouvir. Não tínhamos ilusão de que iriámos agradar a todos. Mas a maioria das críticas tem sido extremamente positivas, e isso nos deixa muito felizes e gratificados. O público também tem reagido muito bem, chegam vários elogios pelas redes sociais. Estamos muito orgulhosos do álbum e da repercussão que ele tem gerado. Para você ter uma ideia, nunca imaginei sequer ser indicado entre os melhores guitarristas do Brasil na votação da Roadie Crew! Fiquei de cara quando vi meu nome lá (risos), ao lado de nomes tradicionais do instrumento, professores de guitarra sempre lembrados pela técnica. Esse tipo de surpresa não tem preço! Só lamento que o Alexandre não tenha aparecido na votação, também. Ele é o melhor baterista que eu conheço!






Metal Samsara – Falando um pouco do futuro, já há planos para o sucessor do CD? Algo pronto em termos de composição ou letras?

Dimitri - Já estamos pensando nisso. Não temos nenhuma música pronta nem letras escritas. Mas as ideias estão surgindo e, adianto, queremos fazer um disco melhor que I Only Smile Behind the Mask. Falam do drama que é uma banda lançar o segundo disco, pois ela tem a vida toda para preparar o primeiro. Mas eu acho responsabilidade mesmo é o terceiro disco, pois é nesse trabalho que a banda tem que mostrar se é realmente diferente e tem personalidade. Penso no Master of Puppets ou no The Number of the Beast, e isso me dá ideia da responsabilidade que é lançar o terceiro álbum. Quanto às letras, pretendo manter a linha que usamos no I Only Smile Behind the Mask, tratando de temas humanos mais profundos, tentando fugir dos clichês habituais do Metal, como guerras, histórias de terror e matanças. Talvez façamos algo inspirado no filme Man from Earth, que foi uma obra indicada pelo Douglas, mas que virou minha cabeça. O filme traz uma discussão muito interessante sobre os limites da vida humana, está bem relacionado com o que abordamos na The Humachine, faixa inspirada no livro do David Gerrold O diabólico Cérebro Eletrônico, e que contou com a participação do Edgar Franco, professor universitário e artista multimídia. 

Metal Samsara – E shows? A banda anda tendo um bom número de convites para tocar? Poderia nos dizer quais são os próximos?

Dimitri - A cena de shows underground no Brasil está muito ruim. Temos feito poucos shows e há pouca coisa agendada. Felizmente, todos os eventos em que tocamos foram fantásticos, muito bem organizados, fomos muito bem recebidos pelo público e não temos do que reclamar da organização. Mas eles são uma exceção cada vez mais rara, há pouquíssimos eventos underground acontecendo. Não sei o que houve, mas o espaço para bandas que fazem as próprias músicas está desaparecendo. Não sei se é falta de público, que talvez não queira ouvir o Metal que produzimos aqui, sei lá. Mas apostaria mais na falta de visão dos produtores, que só abrem espaço para bandas covers ou preferem organizar eventos internacionais. Essas pessoas não percebem que a cena Metal da Europa e dos EUA começou com a valorização das bandas locais, e com isso foi crescendo e formando um público próprio. O Wacken não começou do tamanho que é hoje, no começo era quase uma festa de amigos com bandas da região. Depois cresceu e virou fonte de lucros. Esse negócio de só abrirem espaço para banda covers pode ser bom pro bar fazer bilheteria, mas o que as pessoas vão ouvir daqui a vinte anos? Vão ser as mesmas músicas de Classic Rock que ouvem hoje? Eu nunca parei de procurar novos sons, de querer descobrir bandas novas, gosto muito disso e adoro o metal por causa disso. Não acredito que o fã de Metal vá se contentar em ouvir as mesmas coisas da década de 1980. 

Metal Samsara – Agradecemos pela atenção, e deixamos o espaço para suas considerações finais e mensagem aos fãs.

Dimitri - Grande Marcos, eu só tenho a te agradecer o espaço e parabenizá-lo pelo excelente trabalho que você faz em prol do Metal! Seu blog é excelente e o sucesso que ele vem atingindo só confirma a minha ideia: com profissionalismo e paixão pelo que fazemos não tem como não dar certo ou não ser reconhecido. E quando digo profissionalismo quero exaltar a competência e a vontade de fazer tudo com dedicação. Pois sabemos que quem entra nessa “pela grana” fica frustrado muito rápido, pois o Metal no Brasil só sobrevive pela paixão, porque acreditamos nele. Espero que os leitores do blog se interessem pelo Psychotic Eyes, baixem nosso álbum (www.psychoticeyes.com) e, de alguma forma, se emocionem com a nossa música.






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Fotos: Eliton Tomasi (Som do Darma)
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