Jozilei Pimenta, produtor cultural do Tribus Festival, concedeu entrevista a Over Metal TV.
Tribus Festival é um festival artístico-cultural cuja proposta é promover a diversidade cultural no interior de Minas Gerais, unindo todas as tribos do rock.
Nesta conversa Jozilei falou sobre o desafio de fazer um festival considerando o atual cenário musical, cultural e econômico no Brasil e o que o festival irá proporcionar aos participantes.
Confira!
Entrevista por Phill Lima.
1 - Jozilei, obrigado por atender a Over Metal, nos fale qual otamanho do desafio de fazer um festival em tempos de crise no país onde isso tem impactado na frequência do público até em shows gringos?
Creio que o desafio é sempre do tamanho da paixão e do ideal de cada um e é o que alimenta todos os idealistas que carregam em si um espírito guerreiro e empreendedor. Se fôssemos levar em consideração a lógica de mercado atual em se tratando de shows underground nesses tempos sombrios de instabilidade político-econômica e retrocesso cultural que o país atravessa, o desafio seria vencido pelo medo e, automaticamente, a coragem típica em qualquer tipo de empreendedorismo seria minada. Penso que a grande mídia exerce um papel nocivo no inconsciente coletivo fazendo intensificar a sensação de "crise" para além da realidade, agravando-a, o que não pode ser motivo para estagnar a produção cultural e a movimentação do cenário artístico-cultural. A produção artística e cultural é um importante setor que também movimenta a economia de qualquer país, a chamada economia cultural, não podendo a tal crise ser motivo de óbice para o empreendedorismo e a execução de um projeto cultural qualquer. Este é o maior desafio: manter a resistência e ter a coragem necessária para realizar algo que outra pessoa de senso comum normalmente não teria, sobretudo no interior. É o que poderíamos chamar de investimento cultural de longo prazo. Produzir é preciso. A cultura, o país e as pessoas não podem permanecer na inércia, precisam movimentar a economia, difundir a arte, a esperança, os sonhos e a diversidade cultural.
2 - O que vocês buscaram de solução para fazer da Edição 2017 algo sólido e sem altos riscos?
O festival existe desde 2004, quando ocorreu sua primeira edição no dia mundial do meio ambiente com o sugestivo nome 1º Encontro de Tribos de Carangola, tendo a organização recebido na ocasião uma moção de aplausos na Câmara Municipal de Carangola em virtude do feito e por sua distinta natureza artístico-cultural e socioambiental. Essa primeira edição foi antológica, impactante e um marco para o underground local e regional.
Em 2006 aconteceu a segunda edição e, após um período inativo em que fiquei envolvido na realização de outros festivais, o projeto do festival foi reativado em 2013 e então rebatizado e registrado sob o nome Tribus Festival Brasil, tendo acontecido bienalmente desde então. A produção cultural do festival foi contemplada com o diploma Destaque dos Anos 2015/2016, na categoria Reconhecimento, pela Eventos & Inventos; e, em 2016, o projeto do festival foi aprovado no Edital LEIC 2016 da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais. Já em 2017, finalmente, o projeto alcançou a aprovação também na Lei Federal de Incentivo à Cultura e o festival passou a integrar oficialmente a agenda cultural da cidade de Carangola, através da Lei Municipal nº 4.965/2017, que o insere definitivamente no calendário de eventos do município. O festival vem ganhando reconhecimento, conquistando seu espaço e crescendo gradativamente. Se for pensar friamente, com receio e se ater tão somente aos "riscos", não se faz nada. Como bem dizia Raul Seixas: "o caminho do risco é o sucesso".
E o maior sucesso é a satisfação pessoal da realização um ideal, um projeto no qual venho trabalhando já há bastante tempo. O festival está passando por um bom momento de reconhecimento e alcançando uma boa projeção. Então é no que acredito e aposto no momento porque se nós mesmos não acreditarmos e investirmos em nossas ideias, ideais e projetos, quem mais o fará por nós? A edição 2017 do festival conta com o Apoio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, Ministério da Cultura, Prefeitura Municipal de Carangola/Secretaria de Cultura e Turismo, IEF - Instituto Estadual de Florestas, Over Metal TV, Heavy Metal Online, Rock Brigade, Elegia e Canto, A Música Continua a Mesma, Pólvora Zine, e empresas parceiras.
3 - A escolha do Line UP foi influenciada por isso?
Sim, com certeza. A escolha do line-up foi totalmente influenciada por esse prisma e tendo em vista o estágio bem como o momento oportuno em que o festival se encontra, apesar da tal crise insistir em nos dizer o contrário tentando tolher qualquer iniciativa empreendedora.
4 - O que o festival procurou ao escolher as bandas para esta edição?
A curadoria do festival sempre busca a diversidade de subgêneros do rock e do metal, atendendo aos critérios estabelecidos no regulamento do mesmo, o qual é publicado na página do Facebook quando da abertura das inscrições para as bandas. Na seleção das bandas para o line-up do festival, são avaliados critérios como a qualidade do material apresentado, relevância do conteúdo lírico e musical, performance da banda ao vivo, destaque na cena local, regional e nacional, logística favorável e viabilidade de apresentação da banda dentro das condições orçamentárias previstas, sendo a escolha feita sempre de forma ética e democrática, priorizando as que apresentem maior gradatividade na pontuação ao se levar em consideração a soma de todos os critérios. Desde a primeira edição em 2004 que a ideia do festival é promover a diversidade e a interatividade cultural, reunindo bandas dos mais variados subgêneros do rock e do metal e unindo essas diversas tribos do rock em um festival multicultural envolvendo música autoral, artes visuais, artesanato e conscientização ambiental.
5 - O que o Festival vai oferecer ao público presente além das bandas que estarão no palco do FEST?
Para o público presente no festival, além das apresentações artísticas das bandas no palco, haverá bastante interatividade cultural das diversas tribos do rock com outras formas de linguagem e expressão artística promovidas através da diversidade cultural que o festival abarca. Na tenda cultural haverá o varal de poesias do Tribus, pelo qual o público poderá prestigiar e interagir com as obras expostas dos poetas participantes, escolhendo uma de seu agrado para receber a intervenção "poesia ao pé do ouvido", com a escritora Mônica Pimentel;
Na Tenda Gótica o público afim poderá curtir o melhor do Gothic Rock anos 80, post-punk, darkwave, electro-goth, industrial, Gothic Metal, EBM, Synth-pop com a discotecagem do DJ L entre os intervalos das bandas.Uma das atrações culturais da edição 2017 do festival para o público prestigiar é a exposição de artes visuais Amana, de Thiago Assis. A exposição do artista plástico carangolense Thiago Assis traz parte das ilustrações que acompanham o processo de criação de seu livro, oriundo de um projeto de treinamento profissional intitulado Produção de Livro Ilustrado a Partir da Literatura Indígena, orientado pelo professor Renato Melo Amorim, no Instituto de Artes e Design da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF.
Haverá também os tradicionais expositores de artesanato sustentável local, regional, indígena e alternativo.
Na "Roda das Tribos", ao ritmo da percussão afro-brasileira levada pelo som tribal dos atabaques e do berimbau teremos a apresentação cultural da Associação Camaradagem de Capoeira, oriunda do Grupo de Capoeira Kadara, filial Carangola-MG, Brasil. Associação KADARA Capoeira é uma escola internacional de capoeira fundada pelo Mestre Cicatriz, com sede em Sydney, Austrália, com filiais na Austrália, Brasil, Canadá, Indonésia e Filipinas. KADARA significa destino. A dança de roda Capoeira é uma das manifestações culturais mais fortes da cultura e identidade brasileira, sendo reconhecida como patrimônio cultural da humanidade pela Unesco em 2014. Dessa forma, não poderia ficar de fora da edição 2017 do Tribus Festival Brasil, uma vez que o mesmo visa promover a diversidade cultural, o resgate, a valorização, preservação e difusão da cultura e suas múltiplas manifestações, enfatizando o patrimônio cultural imaterial mineiro e brasileiro.
A tradicional "Fogueira Folk" do Tribus, em alusão às fogueiras das festas juninas/julinas, é mais uma das atrações culturais típicas do festival, visando promover o resgate da ancestralidade e das tradições culturais do interior de Minas e do Brasil. As fogueiras sempre estiveram presentes em todas as culturas antigas, nas confraternizações e rituais das tribos como um elemento sagrado que une as pessoas em seu entorno. Assim, o público poderá interagir com uma vivência xamânica relacionada ao fogo, realizada pelo xamã descendente dos Puris e terapeuta holística, Paola Cássia. "Ao redor da fogueira, os participantes das festas juninas costumam dançar cirandas e danças de roda; herança direta das antigas danças circulares sagradas de diversos povos antigos. O círculo é a imagem perfeita da ciclicidade do tempo, sem começo nem fim, como a eterna sucessão das estações do ano. Ao dançar em círculo ao redor das fogueiras, os antigos europeus harmonizavam-se com os ritmos da Natureza em que viviam".
Outro atrativo cultural do Tribus, que visa proporcionar o resgate e a interação das diversas tribos do rock com as tradições do interior de Minas e do Brasil, é o famoso pau-de-sebo, elemento do folclore mineiro/brasileiro cujo fundo histórico também remete a uma origem pagã. Para quem ainda não conhece, o pau-de-sebo é um mastro untado de sebo que se presta a uma atividade recreativa típica das Festas Juninas. Também é denominado cocanha ou mastro de cocanha. Esta manifestação folclórica foi trazida pelos colonizadores portugueses ao Nordeste do Brasil. A brincadeira consiste em tentar subir em um alto mastro reto e liso de madeira, previamente banhado de sebo ou graxa, ou qualquer outra substância gordurosa, para tentar apanhar um prêmio que se encontra em seu topo. São permitidos truques, tal como trabalho em equipe onde um sobe no ombro do outro tentando ganhar altura. O fato é que na maioria das vezes não se consegue o prêmio, mas sim muita sujeira e melação. É uma diversão para todos que desejem participar, ao contrário de antigamente quando apenas homens poderiam. O pau-de-sebo do Tribus, irreverentemente batizado de "pau de sebo punk", pelo simples fato de ser "muito punk" escalar o mastro para levar o prêmio, também é vegan, ou seja, o mastro será untado com óleo vegetal ou mesmo com a super trash gordura vegetal hidrogenada, e não com sebo de origem animal como tradicionalmente se faz. Quem se habilitar a encarar o pau-de-sebo punk/vegan do Tribus subindo no mastro para tentar apanhar o prêmio em dinheiro no seu topo vai garantir muita diversão com os amigos, além de poder ganhar uns trocados a mais para curtir o festival. A ideia é promover o resgate dessa tradição junina/julina proporcionando a imersão e a interatividade cultural das diversas tribos do rock com os elementos da cultura regional, mineira e brasileira. Uma dica para quem quiser se divertir com a brincadeira junto aos amigos e ainda ter a chance de levar o prêmio, mas não quiser se sujar, é trazer uma peça de roupa extra.
Haverá ainda o inusitado "rolezinho viking a cavalo", outra tradição típica do Tribus, através do qual o público poderá experimentar a "vibe" peculiar de cavalgar de elmo como um viking e ao mesmo tempo interagir com os hábitos, a simplicidade e os costumes do interior de Minas, numa fusão da cultura nórdica com a mineira. Em parceria com o IEF - Instituto Estadual de Florestas, também serão disponibilizadas no espaço de conscientização ambiental do Tribus mudas nativas para plantio, destinadas para doação ao público. Tal ação de educação e conscientização ambiental integra o lema do festival que visa promover o conceito de sustentabilidade produzindo arte com responsabilidade socioambiental.
A ideia é estimular e sensibilizar o público a levar sua muda e plantar sua árvore. Quanto mais árvores no planeta, melhor! Como se vê, conscientização ambiental, diversão, imersão, diversidade e interatividade cultural não faltarão ao público presente no festival.
6 - O que o Tribus Festival almeja ser e representar para o Heavy Metal brasileiro com o passar dos anos?
Como qualquer semente, a meta do festival é se desenvolver, crescer gradativamente de acordo com a estação e se transformar em uma árvore frondosa com raízes firmes e bons frutos. A meta primeira é o cumprimento dos objetivos do projeto e o alcance dos resultados projetados a médio e longo prazo, estimulando a produção artística no interior, fomentando o crescimento e fortalecimento do cenário artístico-cultural local, regional e nacional com a profissionalização cada vez mais ascendente das bandas, artistas e produtores. Essa é a intenção do Tribus Festival Brasil para o rock e o metal brasileiro e enquanto houver saúde e forças continuarei lutando para que o mesmo melhore mais e mais a cada edição e se consolide como um festival open air respeitado e genuinamente brasileiro no interior de Minas, trazendo grandes nomes do rock e do metal para esse público especial do interior, demonstrando que com dedicação e amor ao que se faz também é possível viabilizar a realização de festivais de maneira eficiente e profissional distante dos grandes centros urbanos e capitais. A ideia, além de trazer bandas de renome do cenário para atender aos anseios desse público do interior, que muitas vezes tem de se privar de assistir aos shows de seus artistas e bandas favoritas em função da distância ou se deslocar até os grandes centros para tal, é também estimular o público dos grandes centros a vir prestigiar o festival e a diversidade cultural no interior, interagindo com os hábitos, costumes, tradições e o folclore mineiro/brasileiro.
7 - Por que a preocupação e envolvimento do Festival com o meio Ambiente, conte nos mais detalhes sobre isso?
A preocupação do festival com a preservação ambiental vem de longa data, desde a primeira edição em 2004, ocorrida no dia mundial do meio ambiente, quando a programação contou panfletagem e palestra de conscientização acerca da data, esquete teatral de protesto com temática ambiental (As Quatro Estações), apresentação do Projeto Batendo Lata, que iniciava crianças carentes na música com instrumentos confeccionados a partir de objetos reciclados etc. Sempre fui um defensor da causa ambiental, desde que me entendo por gente, e penso que tal comportamento deveria ser inerente a todo ser humano que se julgue consciente, racional e cidadão do mundo.
Proteger e preservar o meio ambiente é um dever constitucional de todos os cidadãos e de toda a sociedade, conforme bem prevê o artigo 225 da Constituição Federal. Possuo formação profissional de técnico em meio ambiente e habilitação em Terapias Holísticas pela UHB - Universidade Holística do Brasil, portanto não poderia ser diferente minha atitude em relação ao meio ambiente e preocupação pessoal em tratar e proteger o Todo (Holos, do grego), o que naturalmente envolve, além do próprio ser humano, nosso planeta-escola-Terra e sua fauna e flora, enfim, o ambiente em que todos vivemos interligados, onde o equilíbrio ambiental é fundamental. Inevitavelmente esse posicionamento pró-preservação ambiental acaba refletindo nas ações desenvolvidas pelo festival que visa fazer a sua parte promovendo a ideia da sustentabilidade e produzindo arte com responsabilidade socioambiental como já mencionado.
O festival procura trabalhar a conscientização e sensibilização do público através de ações de educação ambiental como disponibilização de lixeiras ecológicas com as devidas distinções para destinação final correta do lixo (papel, plástico, metal, orgânico), de modo a estimular no público e na sociedade a consciência da importância da coleta seletiva para o cumprimento da legislação ambiental e implementação efetiva da Política Nacional dos Resíduos Sólidos pelos municípios. Todo o montante de resíduos sólidos gerados com a realização do festival (latinhas de refrigerante, cerveja, pet) são destinados a reciclagem e à reutilização para produção de artesanato sustentável. Outra campanha de educação ambiental promovida pelo festival é a tolerância zero, ou mínima possível, ao copo descartável, adotando no bar do festival a caneca sustentável personalizada do Tribus para que o público possa apreciar uma boa cerveja artesanal com a consciência tranquila. Por derradeiro, o festival procura plantar a semente da sustentabilidade e da consciência ambiental junto ao público, trabalhando a prática dos três R`s (erres) básicos que permeiam o conceito de desenvolvimento sustentável: reduzir, reciclar, reutilizar.
8 - Há a possibilidade ou desejo futuro de o Festival ter uma edição de 2 dias?
Sim, com certeza. A ideia já existe e pode apostar que haverá todo o empenho necessário para viabilizá-la. Em 2019 o festival completa 15 anos de existência desde sua gênese em 2004 e nada melhor que uma edição especial de dois dias com grandes nomes do rock e do metal para comemorar o aniversário de puberdade do jovem, mas já tradicional festival multicultural do interior de Minas.
9 - Considerações Finais:
Prestigiem as bandas nacionais e os eventos underground e artístico-culturais da sua cidade e região, de modo a garantirmos a rotatividade, fortalecimento e longevidade dos mesmos, além de incentivarmos a renovação da cena e oportunizarmos a descentralização da produção artística e cultural para o interior. O apoio mútuo entre público, bandas, produtores e a mídia independente é muito importante. Para o público das outras cidades, regiões e Estados que ainda não conhece o festival, convidem os amigos e #VemPraRodaDasTribos se divertir, apoiar as bandas nacionais, curtir muita música autoral, artes, interatividade e prestigiar a diversidade cultural no interior de Minas. A união faz a força!
Gratidão ao Phill e a Over Metal pela oportunidade e pelo apoio. Abraço a todos (as).
Confira Mapa de orientações sobre o Festival.