28 de nov. de 2014

Ainda longe de caírem em caixões – Entrevista com o Bandanos



Por Marcos “Big Daddy” Garcia


O Thrash Metal e o Crossover andam em evidência no Brasil nos últimos anos, isso todos já perceberam. Mas um dos nomes que mais tem causado muita comoção dentro da cena underground nacional é o do excelente quarteto BANDANOS, que transita em uma tênue e inteligente linha entre ambos, sabendo aproveitar o melhor dos dois mundos. E quem sai lucrando com isso são os fãs, como podemos comprovar no ótimo “Nobody Brings My Coffin Until I Die”, cuja capa é de um bom gosto irônico que é a cara do grupo, além de ter um conteúdo musical excelente e explosivo.

E como a Heavy and Hell Press nos deu uma forcinha, lá fomos nós conversar com o quarteto.

Marcelo Papa (guitarras)
BD: Antes de tudo, agradecemos demais pela entrevista, e queríamos começar com uma pergunta meio clichê: o que levou a banda a ter um hiato de 7 anos entre “We Crush Your Mind with the Thrash Inside” e “Nobody Brings My Coffin Until I Die”? Não acham que foi um tempo meio longo entre dois álbuns e que isso poderia ter dispersado os fãs mais antigos?

Marcelo Papa (Guitarra): Obrigados vocês pela oportunidade! Na verdade lançamos alguns Splits nessa fase. Não ficamos parados. Esse é nosso lado Punk! Piramos em Splits e sempre achamos uma boa forma de apresentar seu som para públicos que talvez, não atingiríamos com um Full. Sempre tocamos demais. Tivemos duas tours fora do Pais nesse intervalo (2008 pelo Chile e 2009 pela Europa), além da tour de 10 anos, que rodou o Brasil em 2012. Em 2010, trocamos para a formação que temos agora. Em 2013,  nos trancamos para compor o disco, mas sem nunca deixar de fazer shows. O que demorou mais foi a gravação mesmo. Tivemos diversos problemas com o estúdio, depois atrasos de prensagem, confecção da capa (que foi feita pelo artista americano Jeff Gaither). Só nessa brincadeira, perdemos um ano. Banda Underground sabe o parto que é lançar algo nos dias de hoje...risos! Mas a gente não desiste! 


BD: Vocês têm uma forte influência do HC, mas ao mesmo tempo, possuem esta pegada que lembra bastante o Crossover e mesmo o Thrash Metal. E transitar nesses dois mundos, justo vocês vindos de SP, nunca chegou a causar problemas ao BANDANOS? Mesmo porque ainda existem rumores de conflitos entre a galera do HC e do Metal em certos pontos não só de SP, mas em vários locais no Brasil... E o que acham desses conflitos depois de tantos anos do surgimento do Crossover?

MP: No começo, quase 13 anos atrás, isso era mais evidente. Mesmo sendo moleques metaleiros, éramos 4 caras vindos do Hardcore/Punk. Tivemos a aceitação de algumas figuras chaves do Metal e Crossover paulistano. Os caras do Beermug e o Marcelo Rat, que logo depois formou o Criminal Mosh, começaram a mostrar nosso som pras pessoas e começamos uma amizade que dura até hoje. Por esse fator, nós começamos a ser mais aceitos no Metal. Sempre transitamos em todos os meios. Tocamos com Punks, Thrashers, Sxes, Hardcore, Grind, Heavy... Só não tocamos com bandas nazi, homofobias, nacionalistas e preconceituosas, de resto, estamos dentro.

Marcelo (guitarras) e Lauro (baixo)

BD: Outra pergunta ainda sobre o essa questão do Crossover: vocês já estão nessa briga desde 2002, tendo alegrias e sofrendo alguns reveses bem doídos. Nisso, a banda ganhou experiência, logo, como enxergam a cena Crossover de hoje em dia? Acreditam que a coisa anda se fortalecendo e surgindo bons nomes?

MP: Sim, são 12 anos. Mas são anos de muito mais coisas boas do que ruins. Conhecemos muita gente, já que somos uma banda que sempre fez muitos shows. A cena "Crossover" propriamente dita, não está tão forte quanto antes. Temos poucas bandas que levam a sério, gravam e andam pra frente. Algumas pessoas que conhecemos no passado e que compunham a cena acabaram migrando para outros estilos, outras desencanaram. Coisas naturais de uma cena que precisa de renovação. Temos tocado pelo Brasil todo e sempre nos surpreendemos com algumas bandas. Esse ano conhecemos uma banda da região de Jundiaí, chamada O Gosto do Nojo (OGDN). Banda nova de uma molecada empolgada e que parece que vai permanecer ao nosso lado. Da chamada "nova geração", o Imminent Attack é a banda de Crossover que mais gosto. 


BD: Voltando a falar do CD novo. Como surgiu a idéia do título, e existe alguma declaração para muitos ali, de forma mais subjetiva, ou mesmo explícita? E mesmo a capa, um trabalho bem legal do Jeff Gaither que tem uma clara referência ao clássico personagem Django. Como foi que tiveram essa idéia?

MP: Sempre curtimos nomes longos. Decidimos quando montamos a banda, que todos nossos lançamentos teriam nomes assim. Na verdade muita coisa aconteceu nos últimos anos e com a banda sendo umas das mais ativas nas tours pelo pais, tem gente que tenta atrasar seu lado com historinhas e fofoquinhas. O nome desse play vai pra todas elas e pra lembrar que mesmo estando velhos, gordos e ficando carecas, estamos vivos e só vamos parar quando acháramos que é a hora. A capa foi idéia do Gaither. Ele foi esboçando e mandando pra gente. Fomos curtindo a idéia e ela foi tomando forma. Ele é um grande artista, captou bem o lance do titulo do disco e colocou isso em prática da melhor forma que poderíamos ter. Foi uma ótima escolha, com certeza. 


BD: Outro aspecto artístico bem legal é o design do interior, cujas gravuras remontam os princípios do Crossover, quando ainda carregava bastante os elementos do HC. Como foi que reuniram este time de artistas? E como surgiu a idéia de ter as traduções das letras para o inglês? E isso chega a ser uma visão direcionada para o mercado externo?

MP: Sempre piramos em street art, grafites e tatuagem. Transitamos nesse meio e temos muitos amigos. Nosso primeiro disco já tem desenhos de alguns amigos. Acho que dessa vez nós apenas conseguimos executar melhor a idéia, deixar mais em evidência. Além disso, o selo que nos lançou (Laja Rex), nos deu total liberdade e não nos limitou para que pudéssemos fazer uma arte bacana. A escolha dos artistas foi natural, chamamos pessoas que somos fãs e amigos de longa data. Mandamos as letras pros artistas e demos total liberdade pra que eles criassem algo que achassem que iria ilustrar o som. Quanto as traduções, isso também é uma idéia que sempre tivemos, mas por ficar caro demais, não fazíamos. Dessa vez conseguimos conciliar tudo em um encarte sem encarecer o preço final do disco. Achamos importante que o publico lá fora também tente entender as letras. Se tivemos mais condições, colocaríamos as letras até em espanhol. 

Lauro (baixo) e Cris (vocais)

BD: Como foi trabalhar com o Ciero na produção do CD? Chegaram a ter problemas, ou mesmo atritos mais sérios? Mas verdade seja dita: apesar da crueza que é necessária, a música de vocês ganhou requinte e uma qualidade sonora muito boa.

MP: Gravamos 99% das coisas que temos lançado com o Ciero. Ele é um velho amigo, um gênio do Metal. Pegamos uma fase meio complicada do estúdio. Problemas pessoais e estruturais (no meio da gravação, uma forte chuva rompeu uma telha e caiu água na mesa de gravação) atrasaram demais as coisas. Um monte de Zé Povinho nos falavam pra sair de lá, pra desistirmos, mas nos mantivemos firmes! Sabíamos que o resultado final seria satisfatório, como sempre! Tivemos dois assistentes de peso na produção: Alex Spike (Zero Vision/Chemical) e André Stuchi (Imminent Chaos) nos deram uma força enorme nas captações. Exatamente por causa dessa crueza, que nós sempre gravamos no Da Tribo. Sabemos que o resultado vai sair do jeito que nosso som pede. Não enxergamos o BANDANOS gravando em estúdios modernos e mirabolantes, mesmo porque não somos assim. Sempre falo que o Crossover é meio inconsequente, isso não pode mudar. A sonoridade dos anos 80 é o que sempre procuramos e o Ciero, por mais problemas que tenha tido, é o cara que melhor sabe fazer isso na America do Sul. 


BD: Há poucos dias, vocês tiveram problemas com os shows de Belém, e muitas perguntas ainda estão de pé. Aqui, o espaço é de vocês, logo, podem expor tudo sem medo de censura.

MP: Foi uma das piores decepções que tive com o BANDANOS. A tour estava marcada a 8 meses. Por todo esse tempo, esperamos pelas passagens. Elas nunca chegaram. Foi a terceira vez que um show nosso é cancelado por lá, com 3 produtores diferentes. Realmente eu não sei o que acontece. Dessa última vez, depois que a merda aconteceu, dezenas de pessoas e bandas vieram falar com a gente, contamos histórias meio complicadas de serem ditas explicitamente, mesmo porque não temos como provar isso. Parece que os mesmos caras já deram mancada com várias outras bandas também. Pra te falar a verdade, quando anunciei essa tour, duas pessoas bem influentes na cena underground e um dos produtores de outro estado próximo me avisaram que ia dar merda, mas os produtores de lá afirmaram por todo o tempo que tudo ia rolar. Faltando uma semana pro show, as passagens não estavam em mãos e cobrei os caras, que colocaram outra pessoa bem conhecida de lá na jogada, e dizia que tudo dependia dele. Por sua vez, esse outro cara falava que dependia do primeiro. Por fim, um dia antes da tour, depois de terem sumido por uns dias, mandaram uma mensagem, sem muita explicação, um empurrando a culpa pro outro, falando que não ia rolar. Me senti um grande idiota, ainda mais pelo motivo de já ter sido avisado antes. Mas você sabe como é, somos parte do "faça você mesmo", não temos contratos e essas coisas. Sempre cremos que na palavra temos nossa melhor assinatura. Foi frustrante, mas espero que algum dia alguém realmente leve o BANDANOS pra lá. Seria um prazer enorme. 


BD: Duas músicas no CD chamam bastante a atenção, então, que tal comentar as letras? A primeira é de “Vinyl Addiction”, justamente em um momento em que o vinil anda voltando a ficar em voga no Brasil (embora nunca tenha parado no exterior). O que acham disso?

MP: Somos grandes fãs dos LPs. Eu trabalhei em sebos quando era mais novo e sou colecionador. O Cris, nosso vocal, também. Gastamos boa parte dos nossos salários com isso, hahaah... Para nós, essa fase nunca passou. Sempre estivemos garimpando sebos e lojas, muito antes desse revival. Não tem nem como comparar o som, a parte gráfica e o prazer de colocar um disco pra rodar, sentar em seu sofá e ficar observando cada detalhe da capa, ler os encartes, descobrir cada pedacinho de espaço que está ali. Talvez por isso, esteja com força total novamente. Me lembro de pegar plays que hoje são raríssimos, por R$ 3,00, R$ 5,00. Essa supervalorização tá foda de segurar, mas a gente é viciado mesmo. Como diz a letra “ EU PRECISO DE MAIS UM/NÃO SEI ME CONTROLAR”!! Hahahaha...


BD: A segunda é justamente “Bay Area Seduction”, ou seja, parece um hino à Bay Area de San Francisco, que deu muita coisa boa tanto ao Thrash quanto ao Hardcore. Confere? Por favor, exponha suas idéias.

MP: Sim, é uma homenagem singela! Sabemos que quase ninguém das bandas de lá vai escutar, mas foda-se! Temos nosso tributo! Haha.. Temos forte influência das bandas da Bay Area. Muitas delas, junto com as bandas de Venice, nos fizeram querer comprar um instrumento e começar a tocar, nada mais justo, então. Todos que já tocaram em todas as fases do BANDANOS, começaram a tocar e foram influenciados por bandas de lá. Se você prestar a atenção na base que fiz pra esse som, vai perceber uma mistura de Heathen, Metallica, Exodus e Megadeth. O nome da música fui eu que dei. Fiz esse som em um fim de semana, gravei nesses apps de celular e mandei pros caras com o nome de “Bay Area Seduction”, como forma de apelido. O Cris pirou no nome e já fez uma letra justamente falando disso. 

Hell-der (bateria)

BD: Uma das coisas mais incríveis em vocês é justamente a energia no palco, o que eu já pude conferir in loco aqui no RJ. E a quantas andam os shows de vocês? Espero que com muitas propostas boas, e desejo vê-los no RJ ou SP novamente, pois fiquei impressionado!

MP: Marcamos 60 shows esse ano. Vamos acabar o ano executando 54, graças a alguns produtores brincalhões, ou a problemas com as prefeituras locais e os famosos alvarás. Acabamos de voltar de dois shows no RJ. Tocamos em Resende e em Brás de Pina. Foram shows incríveis. Até o fim do ano temos mais algumas datas e logo mais começo a agendar a tour de 2015, que deve ser menor que a desse ano, já que vamos selecionar os lugares mais bacanas que passamos e tentar conciliar com uma nova tour pela Europa. 


BD: Mais uma vez falando de “Nobody Brings My Coffin Until I Die”, como vocês se vêem, olhando para seu passado, esses 11 anos de muita luta, e o atual momento? Houve uma evolução sensível em algum aspecto que gostariam de ressaltar? Ah, sim, como se sentem tendo o disco lançado em CD e vinil? E acreditem, quando vi a foto na página de vocês, quase perguntei o preço do kit com a caveira inclusa (risos)...

Merchandising e a caveira da discórdia
MP: Hahahaah! A caveira não está inclusa, infelizmente! Em fevereiro, completamos 13 anos de vida. Quem tem banda ou é envolvido com o underground, sabe o quanto é difícil durar tanto. Temos poucas bandas, ainda mais de Crossover, que duram tanto tempo. Particularmente, eu acho que vivemos nosso melhor momento. A última mudança de formação nos trouxe de volta o brilho no olho. Hoje, somos 4 caras com vontade de fazer o que fazemos, largando trabalhos, famílias e tudo mais pra poder estar na estrada tocando, gravando e produzindo. Nossas referências também são muito maiores do que anos atrás. Agregamos coisas no som que talvez as pessoas nem façam idéia. Por mais que eu continue fazendo a maioria das bases dos sons, tudo é muito discutido nos ensaios, referências são passadas e testadas, já que ensaiamos a casa do nosso baterista e temos mais tempo pra isso. O fato de envelhecer, amadurecer, tudo isso conta muito hoje em dia e acho que sabemos exatamente até onde podemos chegar, sabemos cada um o seu próprio limite mas sem limitar as ações na banda. Sempre buscamos o consenso. 

Nós temos todos nossos lançamentos em LP e EP 7". Confesso que nunca imaginaria isso. Sorte que o estilo pede o formato. Crossover é muito melhor ouvido em LP, nós crescemos escutando assim. Por isso buscamos o formato e timbres dos anos 80. As gravações atuais das bandas, já são totalmente digitais e depois lançadas em CD, que por mais que tenha um som bacana, perde os graves. Esse CD, acaba virando MP3, comprimindo ainda mais as frequências, deixando tudo que poderia ser grandioso, parecendo um radinho de pilha em certas ocasiões. Eu faço questão de escutar nosso disco em CD e depois em LP. A diferença é ABSURDA! No LP tudo ganha mais brilho e soa brutalmente melhor. Não tem jeito, somos viciados! 


BD: Agradecemos demais pela entrevista, e o espaço é de vocês para a mensagem final e suas considerações.

MP: Muito obrigado pela entrevista! Somos grandes fãs das mídias independentes e se não fossem por elas, não teríamos nem metade da cultura underground que adquirimos hoje em dia. Sigam firmes! Grande a abraço pra vocês e a todos que estão lendo. 

Para saber mais de BANDANOS, acesse:

@bandanoscrossover (Instagram)




O Metal Samsara agradece muito ao BANDANOS e à Heavy and Hell Press, na figura do amigo e irmão Renato Gimli Sansom, por mais esta entrevista.
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