17 de mai. de 2016

MIASTHENIA - Legados do Inframundo (Álbum)


2014
Nacional

Nota: 10,0/10,0

Texto: Marcos "Big Daddy" Garcia


Pegando a deixa da polêmica sobre a extinção do Ministério da Cultura do Brasil, quando vi o tema em debates apaixonados, com apologias cheias de lágrimas (algumas de crocodilos, sejamos sinceros), não pude deixar de pensar comigo mesmo: "oras, um ministério que só servia para divulgar lixo ideológico como cultura é inútil, e seu fim, justificado". Dou-me o direito a esta opinião baseado em muitos fatos e trabalhos que todos conhecemos há anos, mas talvez um nome seja suficiente para que entendam os motivos de minha alegação: MIASTHENIA.

Sim, pois o excelente grupo de Brasília não me parece receber incentivos do governo federal do país. E mesmo assim, é um sopro de originalidade e boa música em nosso país, que o diga "Legados do Inframundo", seu disco mais recente, de 2014.

Quem conhece bem o trabalho do grupo, sabe que terão um Black Metal agressivo e tenebroso, mas repleto de ricas melodias. Se sua música já não fosse diferenciada por si só, basta mencionar que toda a concepção artística e lírica do trio é sobre mitos indígenas da América Latina, o que nos leva a travar maior contato com nossa Alma Mater. Ou seja, é quase impossível de separar o lado instrumental da parte lírica, que formam uma unidade sólida. E os elementos musicais do grupo são o uso de toda a potencialidade de ótimos vocais rasgados (Hécate tem uma voz bem diferenciada dentro do cenário, e, ao mesmo tempo, sabe usar bem seus timbres limpos), riffs técnicos e cheios de melodias (e muito bem trabalhados, com Thormianak mostrando-se um dos melhores guitarristas do Metal extremo nacional), baixo e bateria em uma base pesada e com boa diversidade técnica (em que pese a ausência das quatro cordas ao vivo, e V. Digger é um monstro em termos de técnica e peso), e um trabalho de primeira nos teclados (que dão uma aclimatação tenebrosa em alguns momentos, e em outros, eles ajudam a reforçar as melodias soturnas do grupo, bem como ao vivo suprem a ausência do baixo). O trabalho do MIASTHENIA é realmente belo e precioso.

Miasthenia
A produção é da própria banda em parceria com Caio Duarte (do DYNAHEAD), e tudo foi gravado, mixado e masterizado no BroadBand Studio. Tanto trabalho fez com que o disco tenha uma sonoridade sombria e densa, mas clara para que entendamos o que eles estão tocando. E um dos aspectos mais interessantes é que a banda usa os timbres bem próximos do que eles tocam ao vivo, evitando aquelas famosas perdas de desempenho em seus shows.

E a arte do disco é algo belíssimo, bem feito, e coerente com o lado lírico do grupo.

O MIASTHENIA possui uma diversidade de arranjos excelente, muitas mudanças rítmicas, mas sempre soando coeso, firme, pesado e de primeira. Nada em "Legados do Inframundo" é descartável, nada está sobrando, e é tudo muito cativante, inspirador.

Não sei se vale a pena destacar uma ou outra canção do disco, já que de ponta a ponta, ele é de primeira, fruto de muito trabalho.

Após a introdução de voz e teclados "Deuses Fúnebres", vem a agressiva e bruta "Saga ao Xibalbá" (como as guitarras esbanjam riffs e ótimos licks, sem contar as melodias e harmonias preciosas), seguida da também veloz e cheia de nuances belas de teclados "Entronizados na Morte" (algumas passagem brutalmente soturnas de teclados são ótimas, fora intervenções muito boas das guitarras). Seguindo, temos a lindamente trabalhada "Sacerdote - Jaguar", onde baixo e bateria estão muito bem, diante das muitas mudanças rítmicas, e não tão brutal como as anteriores e explorando um pouco mais o lado melodioso e soturno da musicalidade do trio, temos "Tok'yah", preenchida pelo ótimo trabalho dos vocais, que tornam a se destacar na variada "13 Ahau Katún" (onde o timbre limpo de Hécate mostra-se soturno e gélido, dando uma sensação fúnebre à canção nesses momentos). "Senhores do Mitnal" se inicia de forma grandiosa, mas que logo ganha contornos mais agressivos e intensos, com uma boa dose de velocidade nos andamentos (mas cuidado, pois o trio não é de ficar em apenas um tipo de ritmo, e a bateria de V. Digger dá um show de rapidez nos bumbos em alguns momentos, fora excelentes conduções). Fechando o disco, a climática e melodiosa "Legados do Inframundo", com alguns toques de agressividade providenciais e um trabalho de primeira nas guitarras, com toques melodiosos nos vocais limpos. Mas de bônus, temos "Onde Sangram Pagãs Memórias", diretamente de "XVI", primeiro disco da banda (de 2001), onde apenas os vocais foram regravados, e ela recebeu uma remixagem e remasterização, mostrando a combinação perfeita de agressividade, grandiosidade e melodias, ou seja, a coerência da trajetória do grupo em todos esses anos.

Sei que muitos leitores se revoltarão com as palavras iniciais da resenha. Mas verdade seja dita: o que o MIASTHENIA mostra em "Legados do Submundo" deveria ser mais que suficiente para todos os que choram reverem conceitos...

Uma aula que merecia estar nas escolas, tanto pela música de bom gosto quanto pelo banho de cultura.





Músicas:

1. Deuses Fúnebres
2. Saga ao Xibalbá
3. Entronizados na Morte
4. Sacerdote – Jaguar
5. Tok'yah
6. 13 Ahau Katún
7. Senhores do Mitnal
8. Legados do Inframundo
9. Onde Sangram Pagãs Memórias


Banda:

Hécate - Vocais, teclados
Thormianak - Guitarras, baixo
V. Digger - Bateria


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